terça-feira, 18 de agosto de 2009

Notícias Apocalípticas!







Sufocado por vizinhos e secas, Eufrates está sumindo no Iraque



Retração do rio está castigando os agricultores e ameaça se transformar em fonte de tensão na região


Campbell Robertson



O Rio Eufrates está secando. Sufocado pelas políticas adotadas pelos vizinhos do Iraque, Turquia e Síria, por uma seca que já dura dois anos, e o mau aproveitamento da água pelo governo e agricultores iraquianos, o rio está significativamente mais raso do que era há alguns anos. Algumas autoridades temem que, em breve, o rio se torne a metade do que é hoje.


A retração do Eufrates - rio que foi tão crucial para o nascimento da civilização a ponto de o Apocalipse profetizar que ele secaria, sinalizando o fim dos tempos - está castigando os agricultores ao longo de suas margens, empobreceu os pescadores e vem esvaziando as cidades ribeirinhas, com a fuga dos camponeses para as grandes cidades em busca de trabalho.


Os pobres são os que mais sofrem, mas todas as camadas da sociedade sentem os efeitos disso: xeques, diplomatas e até membros do Parlamento que se retiram para suas fazendas após passar semanas em Bagdá.


TERRA ÁRIDA


Ao longo do rio, os campos de trigo e arroz transformaram-se em terra árida. Os canais definharam e agora são regatos pouco profundos, e os barcos de pesca estão encalhados na terra seca. As bombas destinadas a alimentar as usinas de tratamento de água balançam inutilmente sobre o charco escuro.


"Os velhos dizem que esta é a pior fase da qual se recordam", disse Sayid Diya, pescador de 34 anos em Hindiya, sentado num café ao lado de colegas sem trabalho. A seca está afetando todo o Iraque. A área de cultivo de trigo e cevada no norte teve uma redução de cerca de 95% e os pomares de árvores cítricas e tamareiras no leste do país estão secos.


Há dois anos as precipitações ficaram bem abaixo do normal, deixando os reservatórios secos. As autoridades americanas preveem que a produção de trigo e cevada será pouco mais da metade da safra de dois anos atrás.


Esta é uma crise que ameaça não só a terra entre os dois rios, mas as raízes da identidade iraquiana, de uma nação que já foi a maior exportadora de tâmaras do mundo, fornecia a cevada para fabricação da cerveja alemã e tinha orgulho patriótico do seu caro arroz âmbar.


Hoje o Iraque importa cada vez mais grãos. Os agricultores ao longo do Eufrates dizem, com raiva e desespero, que terão de abandonar o arroz âmbar e contentar-se com variedades mais baratas.


As secas não são raras no Iraque, mas nos últimos anos estão mais frequentes. No entanto, elas são parcialmente responsáveis pela redução do Eufrates e seu irmão mais saudável, o Rio Tigre.


Os culpados citados com mais frequência são os governos turco e sírio. O Iraque tem uma grande reserva de água, mas é um país a jusante desses rios. Há pelo menos sete represas no Eufrates na Turquia e na Síria, segundo os responsáveis pelos recursos hídricos do Iraque, e não há tratados nem acordos, por isso o governo iraquiano se vê obrigado a implorar por água junto a seus vizinhos.


Como o rio não mostra sinais de recuperação, o rancor por causa da água ameaça transformar-se numa fonte de tensão nos próximos meses ou anos entre o Iraque e seus vizinhos. Muitas autoridades americanas, turcas e mesmo iraquianas, ignorando as acusações que consideram uma posição típica de ano eleitoral, dizem que o problema real repousa nas políticas deploráveis adotadas pelo Iraque relativas a seus recursos hídricos.


Ao longo do rio, há muito ressentimento com relação aos turcos e sírios, mas os americanos, curdos, iranianos e o governo iraquiano, são todos responsabilizados. Segundo as autoridades, nada vai melhorar se o Iraque não reformular seriamente suas próprias políticas nessa área e sua equivocada administração da água. Canais com vazamento e práticas de irrigação com muito desperdício de água, além da pouca drenagem do solo deixa os campos tão salgados com a evaporação da água, que mulheres e crianças cavam enormes montes brancos de sal das piscinas que se formam com o escoamento da água.


Numa manhã escaldante em Diwaniya, Bashia Mohammed, de 60 anos, trabalhava numa piscina de drenagem recolhendo sal, única fonte de renda da sua família. "Hoje está tudo seco e ainda tem a água de esgoto. Eles cavam poços, mas às vezes o líquido não chega à superfície e temos de beber água do rio. Meus filhos estão doentes por causa da água", disse ela, referindo-se a um canal que jorra água do Eufrates.


Na região sudeste, onde o Eufrates se aproxima do fim da sua jornada de 2.780 quilômetros e se mistura com as águas menos salgadas do Tigre antes de desaguar no Golfo Pérsico, a situação é grave. As áreas que foram deliberadamente reinundadas em 2003, salvando a antiga cultura dos árabes do pântano, estão secando novamente.


Os agricultores, coletores de junco e criadores de búfalos continuam trabalhando, mas dizem que não poderão continuar se a situação não mudar. "O próximo inverno será nossa última chance", disse Hashem Hilead Shehi, agricultor de 73 anos que vive num vilarejo a oeste dos pântanos, completamente secos. "Se não conseguirmos plantar, as famílias terão de partir."


Fonte: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20090719/not_imp405008,0.php

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