quinta-feira, 26 de novembro de 2009
Espiritualidade e dinheiro
Shalom a todos!
Reproduzo abaixo um excelente texto do Igor, meu professor do curso de teologia.
Boa leitura!
"Em um mundo em que o poder financeiro é um ídolo, para uma pessoa que queira manter sua espiritualidade integrada com seu estilo de vida, é fundamental fazer uso de alguns princípios. Diferente do que muitos podem imaginar, não vou escrever sobre 10 passos para ficar milionário, 7 princípios para acumular tesouros ou 666 dólares para virar uma besta quadrada. O que proponho neste breve post é expor alguns princípios éticos, que pessoalmente adoto, para lidar com a dimensão financeira da vida sem tornar o "dinheiro" e o "consumo" ídolos.
Antes de tudo, digo princípios, pois diferente do que comumente ouve-se, o salvo procura uma vida de justiça, não para se justificar, pois a justificação dá-se pelos vínculos de fé com Cristo, e a salvação é exclusivamente por graça. Neste sentido, a teologia reformada é muito elucidativa.
Porém, o salvo continua no mundo e em constante conflito com os ídolos de seu tempo, sendo assim, a experiência da salvação traduz-se em missão ou na linguagem paulino-reformada, vocação.
A ideia de vocação tem raízes no "chamamento" de Israel, a teologia de Paulo é derivada de uma tradição anterior. A presença de uma nação livre da escravidão (Egito), envolveria algum tipo missão. A libertação não é só "de", mas principalmente "para". Este "para" fala de um "fim", de um "propósito", ou em grego um "télos".
A salvação é pela graça, mas a atuação do salvo, seu papel vocacional, envolve tornar-se "servo da justiça" (Rm 6), o que significa que a atuação do vocacionado pode ser iluminada pela lei, daí o conceito de teonomia* tão propalado por teólogos reformados, que pode ser definido como:
[...] Teonomia é a legislação inspirada por Deus, estabelecida em sua soberana lei da criação... A peculiaridade do Calvinismo é a ideia de que Deus é Senhor e o legislador de todos os homens. Esta ideia pode ser encontrada em Calvino, em sua percepção da vida cristã, quando disse: "nós somos propriedades de Deus, e não somos proprietários de nós mesmo", e "deixe a Sua vontade, então, ser a influência fundamental sobre todos os nossos atos"[...]**
O homem precisa abordar as coisas e o seres da criação segundo princípios da soberania de Deus. Uma relação desorientada, pode conduzi-lo a uma experiência de "apropriação" que é idólatra. A lei regula a relação do salvo com o mundo criado, ela evita o ascetismo, que priva o homem dos desafios das bençãos do mundo criado, mas também, o protege de um apego idólatra. A lei deixa claro, quem é criatura, criação e quem é o Criador. Este é um princípio ético do calvinismo muito próximo da abordagem dos judeus chassídicos da Europa no século XVII.
Então quais princípios "teonômicos" podem ser aplicados na relação do salvo com o dinheiro?
Segue uma sugestão, são princípios que me orientam neste sentido:
1) O dinheiro não pode se tornar um ídolo, Mamom não pode ter primazia sobre Cristo;
2) O dinheiro é meio e não fim;
3) O dinheiro deve prestar um serviço à vida humana e não um de-serviço, o que significa que brigas, discórdias, avareza e outros, não podem existir na vida de um cristão, se isso acontecer, o dinheiro é um ídolo a ser quebrado;
4) Imagine-se sem dinheiro, imagine-se lesado, se isto lhe causa algum desespero, ou passa pela cabeça abandonar a Deus por causa disso, o dinheiro é um ídolo, quebre-o;
5) Não é o dinheiro que te sustenta, mas Deus. Ele o fará como quiser, com dinheiro, com maná, com trabalho, como ele quiser.
6) Meu sustento não vem do meu trabalho, vem de Deus, que pode usar o trabalho para este fim;
7) Trabalhe porque é mandamento trabalhar, o trabalho é um culto, sendo assim o faça com diligência, criatividade e dedicação, o que vem não é resultado do trabalho, mas é graça de Deus. É mandamento "seis dias trabalharás"!
8) Não lide com o dinheiro como proprietário, mas como "gestor", "administrador", faça uso inteligente, mas lembre-se que a relação de "posse" é idólatra, o princípio bíblico é de "hospitalidade", tudo que desfrutamos de Deus é por "graça", a graça do anfitrião;
9) Não se encante com os produtos na vitrine, use roupas simples, compre um carro popular, ande de bicicleta, compre uma casa simples. Crie um equilíbrio entre "dignidade" e "modéstia". É possível viver uma vida de qualidade, com um bom café da manhã, sem ter o melhor carro, a melhor casa, etc. Economize!
10) Doe, seja generoso, doe sem limites. Dê o quanto o Senhor o mover para isso.
Esses são princípios que procuro viver, que regulam meu comportamento e minha forma de ver o mundo e as riquezas. Há outros princípios secundários, mas sem dúvida, se você elaborar uma lista de princípios você será iluminado com a "lei da liberdade" e não com a "autonomia" vendida pelo ocidente. Somente o salvo em Cristo pode desfrutar da liberdade da lei. Esses princípios poderiam ser recheados de referências bíblicas, mas nascem de um ethos judaico-cristão, de uma cosmovisão fundamentalmente monoteísta.
_____________
* Teonomia: Do grego theos (Deus) + nomos (lei).
** Geesink, William (1931) (in Dutch). Gereformeerde ethiek. Kampen. p. (pages unknown).
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